MATÉRIA - EDIÇÃO 7


Neo-Modernistas sem Modernidade?

Professor Camilo Vladimir de Lima Amaral - UFG



O Modernismo não foi apenas um movimento artístico situado num determinado ponto da história humana, foi também uma esperança e um sonho. Ele foi a esperança de que o desenvolvimento da "razão" pudesse alcançar as verdades essenciais das coisas e realizá-las. Assim, acreditaram que poderiam transformar as sociedades arcaicas, cheias de preconceitos e limitações, em sociedades novas que, regidas pela "razão" verdadeira, permitiriam a realização universal do homem. Esse era o sonho que movia o modernismo: a liberdade do homem pela libertação das antigas amarras da tradição.

Para Foucault, desde a Época das Luzes, a "Modernidade" é o momento em que o homem toma, pela razão, "as rédeas" de sua própria vida, e a transforma a partir de um projeto consciente. Modernidade é, portanto, um projeto de mundo melhor, que se estabelece numa atitude crítica frente às limitações do presente, que se estabelece a partir do uso consciente dos instrumentos intelectuais disponíveis para construir um mundo melhor.





Cénotaphe de Newton"

de Étienne-Louis Boullée.

Quando a Forma era pura e

as verdades eram absolutas.




Após o período de crítica ao modernismo nos anos 60 e 70, em que ele foi "negado" por seu reducionismo, por seu etnocentrismo e pelas supostas verdades absolutas da ciência moderna, atualmente vivemos um "revival" da arquitetura "Modernista". Se a princípio isso pudesse parecer o ressurgimento de um sonho, o vemos acompanhado de um cinismo sem "esperanças".

O Modernismo, enquanto movimento em prol do moderno (do novo), perde seu sentido se não está acompanhado da esperança de que o novo será melhor, de que um projeto de Modernidade pode melhorar "o mundo como está". Vejamos melhor. O Modernismo travou luta direta contra o ecletismo e o academicismo porque copiavam soluções que foram pensadas para outras épocas, preocupavam-se com as glórias do passado e apenas as imitavam, sem produzir algo novo com a capacidade da indústria que surgia. Assim, se copiarmos hoje a aparência das glórias do "modernismo", não estaríamos num exercício de academicismo que esquece da profundidade das esperanças de uma época? Podemos hoje ter esperanças de que a indústria e a ciência vão libertar o mundo? Passados mais de um século desta utopia, que resta de Modernidade nos Neo-Modernistas?

Se a Modernidade está atrelada à liberdade, à autonomia dos sujeitos enquanto construtores de seu próprio destino, a arquitetura não pode mais impor uma verdade "formal" à diversidade de "razões" que proliferam no mundo. Qual é mais verdadeiro, Cristo ou Maomé? Quem está certo, Newton ou Einstein? Qual é a geometria verdadeira, a Euclidiana, a Fractal ou a Simbólica?

Se a arquitetura foi várias coisas ao longo da história, definir o que é a arquitetura é uma invenção e, por isso mesmo, é um projeto que se coloca frente à comunidade a que se refere. Assim, definir uma arquitetura e construí-la é realizar no mundo uma "idéia", um posicionamento diante do mundo: é uma definição de como ele deve ser e de como ele deve ser transformado. Num mundo em que a verdade se desfaz cada vez mais em versões de um mesmo fato, o julgamento de qual caminho tomar será sempre uma atitude ética.

A antiga crença na essência única da arquitetura é, hoje, insustentável. Impor uma "forma" universal, clara e distinta construída historicamente nos países de centro é uma colonização da liberdade dos outros. Misturando Marcuse com Lefebvre, a forma arquitetônica deve, hoje, dizer menos o que ela "é" e perguntar mais o que ela "deve" ser: deve instigar as pessoas a produzirem suas próprias verdades sobre o mundo, onde cada um constrói sua própria alteridade enquanto "outro", enquanto diferente.

Onde está a esperança nos dias de hoje? No grandioso ou no pequeno? No estabelecido ou no Sonho? No Universal Absoluto ou na alteridade do outro? Cada resposta possível a estas perguntas é uma atitude ética que inventa uma nova "Modernidade", tão rica quanto mais insana em devaneio, porém, mais real quanto mais o ethos considerar.

Trocando em miúdos, o verdadeiro modernista, hoje, não é modernista.

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